terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Para pensar sobre o Barroco.


O barroco nasceu na Roma dos Papas no século XVII, disposto a envolver os sentidos do mundo católico, a ser uma ponte entre a emoção religiosa medieval e a razão renascentista. As linhas retas das igrejas de estilo maneirista do Renascimento deram lugar a curvas, e seu interior explodiu numa profusão de imagens esculpidas e pintadas de enorme impacto. Em Portugal, enriquecido com o açúcar e o ouro do Brasil, essas imagens cobriram-se de dourado. Salvador, o próspero porto do açúcar e sede administrativa da colônia, de forte presença metropolitana, herdou esse barroco bem português, "oficial". Por exemplo, a Igreja de Nossa Senhora da Conceição da Praia foi construída com pedras trazidas de Portugal. 

Na Igreja de São Francisco, o exterior evidencia a transição de estilos que ocorreu na Europa: duas torres maneiristas, de linhas retas, ladeiam uma portada curva e decorada, tipicamente barroca. O interior magnífico, por sua vez, leva a extremos o ideal lusitano de recobrir minuciosamente todo o interior da igreja com ouro. 


Diamantina: o barroco reprimido



Na região de Vila do Príncipe, explorou-se o ouro até 1729. Nessa data, contudo, ela foi proibida, pois dois anos antes haviam sido descobertas jazidas de diamantes muito mais valiosas. Declarou-se que a extração de diamantes seria monopólio da Coroa e todas as concessões de garimpo do ouro estavam canceladas. A região foi separada de Minas Gerais: em 1731 criou-se o distrito diamantino com sede no Arraial do Tejuco, origem de Diamantina. A área reservada à extração de diamantes foi cercada. Só poderiam habitar ali os diretamente envolvidos com a exploração dos diamantes, que eram os escravos, seus feitores e os donos das lavras. Para evitar o contrabando das pedras preciosas havia várias proibições. As tabernas não abriam durante a noite, quem pedisse esmolas não podia entrar no distrito, ali não existiam irmandades religiosas. Nunca houve uma dose igual de repressão na vida brasileira. 

Entre 1740 e 1771, a exploração de diamantes foi realizada por contratadores, que pagavam à Coroa uma quantia predeterminada. Foi o período de maior crescimento da região. Os contratadores ergueram igrejas como a de São Francisco (acima à dir.), mais singela que a de Vila Rica. Além disso, nos tetos e altares, os pintores locais não ousavam explorar grandes espaços. Segundo alguns analistas, sua pintura contida, quase asfixiada, reflete o cerceamento físico e especialmente psíquico a que estava submetida a população do Tejuco. 


Ouro Preto: o barroco mulato


No final do século XVII, a descoberta de ouro arrastou multidões à "região das minas". Os arraiais se multiplicavam. Um deles, fundado em 1698, tornou-se uma vila em 1711 - Vila Rica, hoje a cidade de Ouro Preto. Em 1734, a população livre era de 4304 habitantes. Já em 1776, ali viviam cerca de 30 mil homens livres e 50 mil escravos. Mas mesmo os filhos de escravos tinham possibilidades de ascensão social nas vilas do ouro, tornando-se artífices respeitados. O mais famoso foi o mulato Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho. 

Executando serviços encomendados pelas irmandades religiosas - específicas para brancos, negros e mulatos - esses artesãos criaram um barroco bem diferente do europeu. O barroco mineiro privilegiava a liberdade de expressão - um sonho de autonomia artística em ressonância com os projetos dos inconfidentes. 
Obra-prima de Aleijadinho, a Igreja de São Francisco de Ouro Preto (acima à dir.) mostra como o barroco local já era profundamente brasileiro. Na pintura do teto, executada por Manuel da Costa Ataíde, anjinhos mulatos rodeiam uma Nossa Senhora também mulata, cujas feições retratam a companheira do pintor.

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